Criação de valor pelos mediadores de seguros

Do valor percebido pelos clientes, ao valor intrínseco para o negócio

Subscreva o Blog

A discussão da relevância da tecnologia na interação comercial com os clientes parece ameaçar o papel da venda tradicional, nomeadamente no retalho, importando perceber o papel do mediador de seguros na sua interação com os clientes tem futuro. Dito de outra forma, o modelo de distribuição de seguros, assente num modelo de negócio B2B2C, continua a fazer sentido? A tecnologia não tende a eliminar os intermediários na maioria da distribuição de retalho? Que valor acrescenta para o cliente o mediador de seguros?

Começando pelo conceito de valor, importa destacar que o mesmo é um conceito fundamental em marketing, assim como o é para organizações empresariais. o conceito de valor, tem evoluído em diversos contextos, sendo o mais relevante o designado customer value ou valor para o cliente. Para o cliente importa o valor percebido, o qual podemos sinteticamente caracterizar seguindo, Kotler, P., Keller, K.L. (2019) como o valor entregue ao cliente, o qual é representado pela diferença entre o benefício total e o custo total. O custo total para os autores inclui o custo monetário (o que é mais relevante), o custo do tempo, o custo da energia física e o custo psicológico.

Os distribuidores de seguros, sejam agentes de seguros ou corretores de seguros, desempenharam um papel historicamente relevante, de tal modo que o mundo dos seguros se confunde com os canais de distribuição na interação com o cliente, essencialmente quando nos focamos no tomador de seguros.

Quando o cliente procura seguros, seja por necessidade legal, seja porque em bom rigor quer transferir um conjunto de riscos, em busca da peace of mind, com a consequente proteção financeira oferecida por uma seguradora, a relevância do preço é inquestionável tanto mais que os seguros durante anos tiveram um comportamento especulativo. A componente do esclarecimento, intrínseco à especificidade da linguagem contratual, a necessidade de esclarecimento pré-contratual, traduz-se num custo psicológico para o cliente, que sente algum desconforto em assumir o autoconhecimento da pesquisa dos conceitos e validação da terminologia em modo self service, apesar da tecnologia o facilitar. O entrave da linguagem de redação e os requisitos impostos pela Lei da Distribuição (lei 7/2019), para a ultrapassagem da informação pré contratual, acabam por serem um custo elevado.

Os custos associados ao tempo economizado, com destaque para o custo de oportunidade, e a poupança de energia física, são dois fatores que poderiam favorecer a eliminação da intermediação off-line, isto é, da mediação de seguros, seja ela qual for o canal (tradicional ou bancassurance).

O resultado da equação do valor percebido pelo cliente, quando se dirige a um mediador de seguros para transferir um risco para uma seguradora, tem presente os benefícios desse tipo de compra. Na aceção apresentada pelo especialista de marketing citado acima, esses benefícios são a valorização associada aos serviços prestados e a imagem detida pelo mediador, bem como o segurador, que se apresentam semi-gémeos na valorização. Este fato decorre da necessidade de explicar ao cliente qual a melhor opção, decomposta em coberturas obrigatórias e opcionais, capitais, franquias e exclusões entre outros. Partilha da experiência sobre os níveis de qualidade intrínsecos ao pós-venda, com destaque para a rapidez e acuidade com que se regularizam os sinistros, bem como a confiabilidade da interação mediador-seguradora.

A imagem detida pelo mediador de seguros (agente ou corretor) é outro dos fatores em destaque nos benefícios implícitos da escolha do cliente, não só porque parecendo um valor intangível para muitos, se revela decisivo no posicionamento que o cliente detém acerca da marca que esse distribuidor representa.

Acresce ainda o efeito independência, que em produtos como os seguros, onde não existe na maioria deles, uma diferenciação, a mesma acaba por ser transponível para a mais-valia comunicacional, explicativa e a capacidade de interação junto das seguradoras, no mais critico dos touch point da jornada do tomador de seguros, o sinistro. Os seguros são necessários porque efetivamente o risco existe e manifestar-se-á com maior ou menos probabilidade no tempo futuro. A necessidade de transparência para com o consumidor, que somente a mediação independente consegue corporizar plenamente, ainda recentemente foi mote de alerta por parte da ASF na 8ª conferência anual sobre seguros, do Jornal de Negócios. Essa necessidade de transparência foi destacada não só no campo comercial, mas também no pós-venda, como fator de redução de conflitualidade e de apresentação de soluções mais ajustadas, adequadas à experiência do consumidor.

Os mediadores de base tecnológica podem criar valor para os clientes?

Na análise desta questão, damos como adquirido que na distribuição de seguros, num contexto de proteção dos consumidores, e necessidade de independência na formulação do aconselhamento, que a tecnologia é neutra, as seguradoras são risk takers e distribuidores grossistas (whole sales).

Então como podemos configurar o papel de um mediador de base tecnológica?

O papel da inovação na área da distribuição, é crucial não só para acompanhar tendências futuras, mas essencialmente para criar mercado. Sabemos que quando Elon Musk decidiu avançar com o projeto Tesla, já existiam imensas pesquisas e protótipos na área do carro elétrico. Conjugar essas inovações que se apresentavam como tendências e criar mercado esteve na sua decisão empreendedora que marcou definitivamente uma aceleração da transformação do automóvel, em direção a energias mais sustentáveis.

Há uma desconfiança evidente dos reguladores, relativamente ao impacto da tecnologia na mediação de seguros, quando claramente se posicionam com uma vontade ex. ante de monitorização de tudo o que se associe ao big data e à inteligência artificial, para protegerem os consumidores quanto à oferta e pricing, sob a umbrella da segurança e proteção de dados.

A interação com os consumidores de seguros, desenvolvida a partir da recolha, análise e tratamento dos dados produzidos durante a sua jornada, adicionados de outros dados disponíveis no ciberespaço, ajudará ao conhecimento mais profundo das suas necessidades em contexto digital e consequentemente a apresentação de soluções mais adequadas. Os exemplos desenvolvidos pelas plataformas de distribuição de retalho, são ciência feita e devem ser adaptados e adotados pela mediação de seguros. Há evidencias estatísticas da relação entre a satisfação do cliente e as ofertas proporcionadas pela venda preditiva, assente em modelos de inteligência artificial, que economizam muito tempo e desgaste ao cliente, constituindo uma mais-valia no valor percebido por este.

O mesmo se passa na estratégia de retenção de clientes, onde a informação preditiva, pode desencadear propostas de oferta de cross-selling e de up-selling ajustadas ao perfil do cliente, onde a taxa de rejeição e de conflitualidade são tendencialmente nulas.

A lógia taylor-made produzida pela aplicação da inteligência artificial à distribuição de seguros, proporcionará não só um aumento das vendas, como vendas com menor churn-rate, e ainda a incorporação na proposta de valor percebida pelo cliente de mais valia a incorporar em cada momento da sua vida, tais como, comunicações pedagógicas, associadas aos diversos momentos de verdade, a acontecimentos da vida própria dos clientes (aniversários, manifestações desportivas, convívios, viagens, etc.), ou externos( alterações climatéricas, emergência de produtos sustentáveis, proteção da natureza ou animais, etc.) potenciadoras da sua proteção intrínseca e redutoras dos custos de sinistros. Desenvolver-se-á assim um ciclo virtuoso de rentabilidade partilhada para todo o ecossistema segurador.

A mudança proporcionada pelos modelos tecnológicos de interação com os clientes, ainda tem um longo caminho a percorrer, mas estudos efetuados em países como os UAE, demonstraram que 46% dos consumidores de seguros são suscetíveis de mudar de fornecedor de serviço ou até de segurador, com a expirentação de novos modelos de mediação, onde a valorização da relação se evidenciou pela necessidade de aumento dos pontos de contacto, seja via comunicação de novas ofertas, seja por interação com mais valias para a proteção embebida de pequenas dicas.

A mediação de seguros no modelo tradicional, revela várias fragilidades de implementação de uma solução equivalente, baseada no principio das relações humanas onde se destacam, o fraco conhecimento do perfil do cliente, devido a não possuírem apoio de ferramentas analíticas de business intelligence orientadas ao tratamento da informação focada nas necessidades do cliente (quem é, o que precisa, quando precisa, onde precisa, que soluções alternativas), a falta de conhecimento para satisfazer as necessidades de forma proactiva (a nível de formação profissional em seguros, de técnicas de abordagem da venda, domínio de tendências, desconhecimento da concorrência), e o custo associado ( seja monetário, seja de oportunidade).

Os modelos híbridos poderão ser o caminho que permite a adaptação, o desenvolvimento e a aprendizagem contínua, capaz de projetar estádios alternativos para a adaptação dos modelos de negócio.

Em síntese criar valor para o cliente, é essencialmente desenvolver uma relação favorável no balanceamento dos custos totais associados à compra (com enfoque nos seguros intermediados), com os benefícios totais esperados (porque nos seguros efetivamente os benefícios da proteção são diferidos, e apenas o peace of mind é imediato) e traduz-se no conceito de valor percebido.

Criar valor para o distribuidor de seguros, será assegurar a geração de comissões e incentivos que suportem os seus custos de estrutura e de funcionamento, permitindo continuar a crescer, ganhando quota de mercado, e obtendo lucros adequados ao investimento efetuado. A maximização do valor criado, numa perspetiva de equity value, será maximizada pelo valor percebido pelo cliente, proporcionador de retenção (churn rate tendencialmente nula), aumento da fidelização (evidenciada na progressão do cross selling e up selling) e na transformação progressiva dos clientes em admiradores da marca (evidenciada em recomendações de compra, seguidores ou pertença a uma comunidade correlacionada com a marca).

Referencias bibliográficas

Kotler, P., Keller, K.L. (2019). Administração de marketing. Pearson Brasil, São Paulo.

 

Autor : Fernandes da Silva

Autor : Fernandes da Silva

General Manager: A. Fernandes da Silva Consulting Lda

Subscreva o Blog

Conteúdos e Insights exclusivos...

Bem vinda/o ! Esteja atenta/o à sua caixa de entrada...

Share This