Distribuição de seguros em Portugal: tendências
Subscreva o Blog
Distribuição de seguros em Portugal: tendências
Analisar a distribuição de seguros, à luz da Diretiva de Distribuição da União Europeia (Diretiva 2016/97, regulamentada em Portugal através da lei 7/2019 de 16 de janeiro de 2019) importa para compreender as tendências futuras da mesma em Portugal. Formulamos as seguintes questões:
- As características fundamentais à salvaguarda da concorrência e da proteção dos consumidores de seguros estarão garantidas?
- O atual quadro operacional da distribuição, perspetiva tendências de rutura ou de continuação?
Os modelos de negócio adotados pelas seguradoras são refletidos na sua estrutura de custos e proveitos, isto é, na sua fórmula de lucratividade, decorrente do seu output core (a sinistralidade) bem como do seu expense cost (aquisition cost + administrative cost). A importância dos canais de distribuição é fundamental para a alocação da proposta de valor, através da venda e comunicação com os tomadores de seguros.
A relevância da distribuição é evidenciada na estrutura de custos de aquisição e ainda na componente do cost to service direta e indiretamente associado. Este efeito conduz na perspetiva académica e prática a que a abordagem dos modelos de negócio da indústria seguradora esteja assente na categorização induzida pelos canais de distribuição. Falamos assim em modelos negócios: tradicional, bancassurance, digital e híbridos. A preocupação que as seguradoras têm manifestado ao longo dos anos quanto à maximização da sua lucratividade e competitividade, decorre muito da sua capacidade para racionalizar as componentes agregadas dos custos de distribuição e melhorar a margem técnica. A eficiência das seguradoras é um fator crítico de sobrevivência. O processo de subscrição deve garantir a maximização esperada da margem técnica a partir dos prémios cobrados aos tomadores de seguros, que Johannsdottir (2014) subdivide em quatro passos:
“(1) a recolha da caracterização do risco, fornecida pelo cliente e/ou agente de seguros, através da proposta e seguro, (2) a subscrição propriamente dita e o desenho da apólice, (3) a emissão da documentação das coberturas, exclusões, capitais e/ou franquias associadas através da emissão da apólice, (4) a emissão da fatura e/ou recibo do pagamento”.
Os distribuidores estão classificados em mediadores de seguros (agentes e corretores), mediadores de seguros a título acessório e as empresas de seguros, potenciam formas de concorrência e de transparência para os consumidores de seguros diferenciadas. Enquanto corretores de seguros, agentes de seguros independentes, ou mediadores de seguros a título acessório independentes protagonizam alternativas nas escolhas dos clientes, agentes exclusivos ou empresas de seguros enquanto distribuidores refletem, uma solução não alternativa na escolha final dos tomadores de seguros. Shetty & Basri (2020) no estudo desenvolvido para avaliar se o canal tradicional é mais ou menos eficiente comparativamente à bancassurance na Índia, encontraram evidências de maior eficiência nos canais tradicionais. O papel dos canais tradicionais na indústria seguradora não vida é fundamental para a criação de mercado, dada a diversidade de riscos a transferir. São olhados pelos clientes como mais independentes e eficientes no apoio ao tratamento dos sinistros. O conflito de interesses estudado na teoria do agente principal entre tomadores de seguros e seguradoras, é minimizado pela capacidade de criação de mercado das redes tradicionais e pela implementação de tecnologias de combate à fraude na gestão dos sinistros ex-ante e durante os contratos (apólices).
Analisando o número de mediadores de seguros em Portugal na sequência da entrada em vigor da diretiva de distribuição acima referenciada deparamo-nos com o seguinte quadro:
Dados tratados pelo autor a partir de reportes da ASF
A tendência de redução do número de mediadores de seguros inscritos na ASF em Portugal tem sido consistente para o período analisado de 2017 a 2022, com exceção do ano de aplicação da “limpeza” imposta pelos requisitos de qualificação profissional de formação e do seguro de responsabilidade civil profissional refletida em 2020 nas exigências regulatórias. O mesmo efeito foi observado em todos os países da União Europeia. O balanceamento da evolução tecnológica, as novas tendências dos consumidores em geral e a estrutura de mercado segurador, conduz-nos a sugerir o seguinte:
- Uma tendência crescente para a racionalização de distribuidores de seguros, nos canais tradicionais e de bancassurance, efeito da consolidação dos mesmos impulsionada pela racionalidade económica cruzada com a aquisição de bens e serviços on-line.
- No caso do canal de bancassurance (venda através de balcões dos bancos, distribuição postal ou intermediários financeiros de investimento) a redução da presença física e do efeito proximidade, conduz a adoção de novos modelos contratuais da operação do canal, com preponderância para acordos multi-distribuição em alternativas a joint ventures. A inclusão de integração tecnológica com os seguradores e em simultâneo a perda de capacidade de criar mercado baseado no seu core relacional, poderá ser ocupado por distribuidores tradicionais (agentes de seguros e corretores) e por novos distribuidores especializados (oriundos do grande retalho tecnológico como a Amazon, Google ou Apple para citar alguns, ou do retalho de proximidade como cadeias de eletrodomésticos, livros e consumo diverso, apoiados em call centers).
- Emergência de canais digitais especializados, segmentados e focados em distribuição de produtos simples com captura de valor a partir de plataformas articuladas com seguradoras em produtos complexos ligados a soluções de transportes, responsabilidade civil entre outros.
A evolução da tecnológica transporta-nos para um novo paradigma que se ofuscou no dobrar da década passada, baseada numa distribuição esperada a partir dos canais de marketing digital puro e duro. Os modelos de cooperação e alavancagem tecnológica com os distribuidores de seguros tradicionais é o caminho cada vez mais seguro para a criação de mercado.
A “open insurance distribution” baseada no aumento de dados e na mudança tecnológica protagonizada pela 4ª Revolução Industrial, marcará esta década a partir de processos inovadores. A proteção natural das pessoas (RGPD) deverá estar presente, podendo limitar a sua expansão. Oportunamente voltaremos a este tema para debater riscos e benefícios e compreender as barreiras existentes no desenvolvimento do “open insurance”.
Referências bibliográficas:
ASF (2022). Estatisticas: mediação anual.
EIOPA (2022). Open Insurance: accessing and sharing insurance-related data.
EIOPA (2023). Consumer trends report 2022.
Johannsdottir, L. (2014). Transforming the linear insurance business model to a closed-loop insurance model: a case study of Nordic non-life insurers. Journal of cleaner production, 83, 341- 355.
Shetty, A., & Basri, S. (2020). Assessing the technical efficiency of traditional and corporate agents in Indian Life Insurance Industry: Slack-based data envelopment analysis approach. Global Business Review, 21(2), 490-506.
DISCLAIMER:
A responsabilidade técnica e operacional do artigo recai totalmente sobre o seu autor, exprimindo o seu ponto de vista. A utilização do mesmo por terceiros, carece da autorização prévia do autor regulando–se pelas regras do direito de autor para Portugal e restantes países da União Europeia, nomeadamente a aplicação da regulamentação do copyright, decorrentes dos artigos 75 e 76 do DCADC. A utilização para efeitos académicos, enquadra–se nas regras da contrafação (plágio) reguladas nos artigos 196,197 e 200 do CDADC.
Autor : Fernandes da Silva
General Manager: A. Fernandes da Silva Consulting Lda