Recensão do artigo de Kevin Keller “ o papel e a importância das marcas para as empresas”

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Recensão do artigo de Kevin Keller “ o papel e a importância das marcas para as empresas”

O artigo científico “consumer research insights on brands and branding: a JCR curation”, publicado no “ Journal of Consumer Research” em 2020, da autoria de Kevin Lane Keller, sintetiza uma investigação atual sobre as marcas em torno de cinco tópicos. Quatro envolvendo o consumidor, a razão de ser da marca, e um sobre a gestão da própria marca.

Introdução

O autor é um reconhecido académico da área do marketing. É professor na Tuck School of Business em Dartmouth College. É autor e coautor de vários livros e tem desenvolvido a sua pesquisa académica em torno da marca, da sua estratégia, medição, construção e gestão de valor, além de outros temas de marketing. Tem publicado diversos artigos científicos acerca deste tópico. O artigo  “consumer research insights on brands and branding: a JCR curation”, relacionando a importância do marketing com uma perspetiva de marketing mix, foca-se na relevância da marca para os consumidores, na forma como se relacionam com a mesma, e como respondem à mesma em diversos contextos, quais os seus efeitos sobre os produtos ou indústrias, personalidades ou imagem, país de origem entre outros. Os objetivos do artigo analisado, centrando-se na investigação da marca são os seguintes:

“The pleasure and/or pain of brands
Brand attachment and loyalty
Consumer relevance and distinctiveness in branding
Consumer communications about brands
Managerial branding considerations”

O texto desenvolve o estado da arte sobre o tema, à data da publicação do artigo, evidenciando o contributo de dois autores de referência para cada um dos subtópicos indicados, bem como a visão própria de Keller. Este artigo interage com a visão, da própria história da pesquisa sobre a marca, num outro artigo publicado no mesmo ano, produzido por Oh, et al. (2020) que inclui Keller e ainda, a continuidade de desenvolvimento do tema pelo autor, Keller (2021) no artigo, designado de “ The future of brands and branding: an essay on multiplicity, heterogeneity, and integration” com o foco na abordagem da temática nas organizações não lucrativas, cujo perfil de consumidor difere do consumidor empresarial.

Síntese

O artigo ao focar a sua abordagem em torno dos cinco tópicos mencionados, traz à colação uma diversidade de assuntos que caracterizam a pesquisa sobre as marcas.

– O tópico “the pleasure and/or pain of brands” começando por assumir o papel diferente que a marca tem para os consumidores, acaba por reconhecer o contributo positivo (plesasure) e negativo (pain) da mesma. Citando Reimann, Nunez e Castano (2017) evidencia-se a conexão entre o sofrimento físico e marca, que podem exigir apoio psicológico dada a relação existente com os consumidores. Quando uma marca-ídolo se desmorona, parte dos consumidores sofrem com ela. Isso evidencia- se, por exemplo quando uma seguradora é absorvida por outra, como ocorreu quando a marca Império foi integrada na Fidelidade, e a ligação rede distribuição- clientes era tão forte, que tiveram dificuldade em assumir pertencerem à nova marca. O mesmo se passou com a decisão de gestão de manutenção da marca Tranquilidade aquando da aquisição desta pelo Grupo Generali.A partir do estudo citado de Brick et al. (2018) onde se reconhece que “as marcas estão embebidas na vida dos consumidores e fazem parte da sua identidade”, passa para a conclusão de que “a mesma marca pode extrair decididamente diferentes respostas a partir de diferentes pessoas”, pelo que o “downside” de uma marca deve ser tratado com cuidado pelos marketers.

– O tópico brand attachment and loyalty começa por reconhecer que nem todas as marcas tem a mesma importância e compreensão pelos consumidores. Assim as empresas procuram criar laços fortes com os mesmos. Keller, seguindo o padrão de investigação mencionado, destaca os fatores que afetam as relações de lealdade dos consumidores a partir do estudo citado de Khamitov, Wang e Thomson (2019) onde afetividade e a confiança são bons fatores para prever a lealdade dos consumidores a qual pode ser medida pela elasticidade média, da relação consumidor/marca e consumidor/lealdade. Utilizando a análise efetuada em contexto de aglomeração por Huang et al. (2018) para avaliar o comportamento do consumidor, que sugere um impacto positivo em determinadas circunstâncias, permite a Keller recomendar aos marketers, que tomem decisões de gestão sobre a relação dos consumidores com a marca, tendo presente os pressupostos de comportamento dos mesmos em determinados locais específicos, muito embora deva ser relevado o seu efeito contingente.

– O tópico “consumer relevance and distinctiveness in branding” reconhece o caracter-chave da diferenciação como um valor único a ser oferecido aos clientes pela marca, num mundo onde os produtos sendo cada vez mais iguais e globais, distinguem-se pelo efeito da marca e sua relevância. Voltando mais uma vez por exemplo ao tema dos seguros, podemos observar que um seguro auto de responsabilidade civil, é basicamente igual em todas as seguradoras em Portugal (não há diferenciação de produto). O que provoca então uma diferença de prémios acentuada entre seguradoras? Mais do que fatores técnicos (que não vamos relevar aqui) é o efeito da marca que pode fazer a diferença, associado ao serviço pós- venda. Keller, associa a diferenciação e a relevância à procura personalizada, associada à distinção da marca, a partir dos sentimentos de distinção evidenciados por Torelli et al. (2018) sobre o alinhamento das marcas com a cultura. Citando Puzakova e Aggarwal (2018) evidencia o efeito negativo da antropomorfização da marca, nomeadamente no mundo digital para o qual não há respostas seguras. Estas conclusões que são evidenciadas no estudo citado revelam, que a diferenciação da marca depende do posicionamento da mesma junto dos consumidores. Uma marca como patrocinadora por exemplo de futebol, reforça a identidade junto dos consumidores, mas a marca como agente de futebol, conduz à frustração de uma parte dos consumidores.

– O tópico “consumer communications about brands” foca-se no centro vital das marcas: a comunicação, onde hoje comunicar através de diferentes canais, com diferentes destinatários e onde a comunicação é “paid-earned-owned-shared”, requer uma compreensão do “como, quando, onde e quem”. Na linha traçada no artigo, Keller citando Villaroel Ordenes et al. (2019) refere a importância da comunicação informal e emocional e citando Shen e Sengupta (2018) procura explicar o efeito para as marcas da conversa acerca das mesmas efetuada pelos clientes, através da chamada “word of mouth” para a diferenciar da “word of mouse”, isto é, da comunicação escrita. Reconhecendo que o poder da comunicação oral é superior na medida em que expressa pensamentos e emoções e, portanto, pode alavancar as marcas, Keller reconhece que num mundo digital, a comunicação oral tem uma importância crescente no marketing e pode reforçar as ligações às marcas. Isto acontece com os influencers por exemplo.

– O tópico “managerial considerations in branding” debruça-se sobre a importância da gestão e proteção das marcas no curto e longo prazo, reconhecendo o enorme gap existente entre académicos e práticos, podendo o tema, beneficiar dos conhecimentos adquiridos a partir da investigação. Citando Preece et al. (2019), Keller evidencia a longevidade das marcas que se adaptam no tempo. No estudo de van Horen e Pieters (2017) é enfatizado o fato de imitar de determinada marca poder ter vantagens para a marca imitada, se esta estiver fora da categoria do imitador. Mas prejudica marcas líderes nacionais, criando um problema para a gestão com implicações a nível das políticas públicas. Sugere investigação sobre os aspetos legais das marcas como ativos intangíveis.

Análise crítica/interpretativa

O artigo que analisamos apresenta uma característica muito interessante a partir dos tópicos de pesquisa efetuada por Keller, que o próprio sintetiza em sugestões para o futuro (numa perspetiva de limitações evidenciadas no mesmo) a saber:

Emoções e sentimentos da marca – partindo do próprio conceito de marca, que Keller (2003) e John et al. (2006) elaboraram, “como sendo o que os consumidores sabem, pensam e sentem acerca da marca”, destaca um conjunto de perguntas desafiadoras de novos desenvolvimentos centradas nas emoções e nos sentimentos dos consumidores.

Os intangíveis da marca – a diferenciação aumenta os intangíveis da marca que podem assumir diversas formas escrutináveis pelos consumidores, pelo que se 5 levantam um conjunto de interrogações que poderão ser campo para novas investigações, em torno de opiniões, herança, posição, expetativas e natureza subjetiva da marca.

O posicionamento da marca – em torno do posicionamento que os consumidores possuem de uma marca em detrimento de outras, a prática evidencia que o interesse se reflete essencialmente para os produtos que se consomem. Mas isto não dispensa que novas questões deixem de ser colocadas em torno da estratégia, do conhecimento, do envolvimento e do cuidar da marca para e pelos consumidores. –

O propósito da marca, o storytelling e as narrativas – reflete a mudança do ambiente de marketing e dos objetivos sociais que envolvem as marcas, dos quais emergem perguntas acerca do propósito das marcas e da sua importância para os consumidores, bem como das narrativas potenciais em torno dos produtos ou serviços.

Medir a marca – é uma questão sempre em aberto, hoje mais que nunca, com recurso a novas técnicas (que não os focus group e os inquéritos) como técnicas neuronais, ainda não suficientemente validadas, necessárias num contexto cada vez mais digital e tecnológico.

Conclusão

O artigo em preço evidencia a relevância da marca. Keller conclui referindo que “marcas e consumidores estão inequivocamente ligados”, na medida em que “as marcas existem para os consumidores” e os consumidores geram o “valor da marca”. A influência e o papel da marca mudarão dramaticamente, referem Oh et al. (2020). Isto está implícito nas perguntas deixadas pelo próprio Keller depois da abordagem dos cinco tópicos. Qual o papel da marca num mundo cada vez mais digital, onde cresce a realidade aumentada (VA) e a virtual (VR) e onde as plataformas online interagem com os wearables da internet of things (IoT)? Gerir comunicação e marcas, reconhecendo o papel dos consumidores numa realidade em mudança acelerada são questões para as quais o artigo deixa pistas de investigação e reconhece que que não possui respostas acabadas.

Referências Bibliográficas

Brick, Danielle J., Grainne M. Fitzsimons, Tanya L. Chartrand, and Gavan J. Fitzsimons (2018), “Coke vs. Pepsi: Brand Compatibility, Relationship Power, and Life Satisfaction,” Journal of Consumer Research, 44 (5), 991– 1014.

Huang, Xun (Irene), Zhongqiang (Tak) Huang, and Robert S. Wyer Jr. (2018), “The Influence of Social Crowding on Brand Attachment,” Journal of Consumer Research, 44 (5), 1068–84.

John, Deborah R., Barbara Loken, Kyeongheui Kim, and Alokparna Basu Monga (2006), “Brand Concept Maps: A Methodology for Identifying Brand Association Networks,” Journal of Marketing Research, 43 (4), 549–63.

Keller, K. L. (2020). Consumer research insights on brands and branding: a JCR curation. Journal of Consumer Research, 46(5), 995-1001.

Keller, K. L. (2021). The Future of Brands and Branding: An Essay on Multiplicity, Heterogeneity, and Integration. Journal of Consumer Research, 48(4), 527-540.

Keller, Kevin Lane (2003), “Brand Synthesis: The Multidimensionality of Brand Knowledge,” Journal of Consumer Research, 29 (4), 595–600.

Khamitov, M., Wang, X., & Thomson, M. (2019). How well do consumer-brand relationships drive customer brand loyalty? Generalizations from a meta-analysis of brand relationship elasticities. Journal of Consumer Research, 46(3), 435-459.

Oh, T. T., Keller, K. L., Neslin, S. A., Reibstein, D. J., & Lehmann, D. R. (2020). The past, present, and future of brand research. Marketing Letters, 31(2), 151-162.

Preece, Chloe, Finola Kerrigan, and Daragh O’Reilly (2019), “License to Assemble: Theorizing Brand Longevity,” Journal of Consumer Research, 46 (2), 330–50.

Puzakova, Marina and Pankaj Aggarwal (2018), “Brands as Rivals: Consumer Pursuit of Distinctiveness and the Role of Brand Anthropomorphism,” Journal of Consumer Research, 45 (4), 869–88.

Reimann, M., Nunez, S., & Castano, R. (2017). Brand-aid. Journal of Consumer Research, 44(3), 673-691.

Shen, Hao and Jaideep Sengupta (2018), “Word of Mouth versus Word of Mouse: Speaking about a Brand Connects You to It More than Writing Does,” Journal of Consumer Research, 45 (3), 595–614.

Torelli, Carlos J., Rohini Ahluwalia, Shirley Y. Y. Cheng, Nicholas J. Olson, and Jennifer L. Stoner (2017), “Redefining Home: How Cultural Distinctiveness Affects the Malleability of In-Group Boundaries and Brand Preferences,” Journal of Consumer Research, 44 (1), 44–61.

Tuck, Dartmouth College (2022). Faculty directory. (visualizado no site em 8/5/2022). https://www.tuck.dartmouth.edu/faculty/faculty-directory/kevin-lane-keller van Horen, Femke and Rik Pieters (2017), “Out-of-Category Brand Imitation: Product Categorization Determines Copycat Evaluation,” Journal of Consumer Research, 44 (4), 816–32.

Villarroel Ordenes, Francisco, Dhruv Grewal, Stephan Ludwig, Ko De Ruyter, Dominik Mahr, and Martin Wetzels (2019), “Cutting through Content Clutter: How Speech and Image Acts Drive Consumer Sharing of Social Media Brand Messages,” Journal of Consumer Research, 45 (5), 988–1012.

Artigo cientifico: Consumer research insights on brands and branding: a JCR curation. https://academic.oup.com/jcr/article-abstract/46/5/995/5637759

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Autor : Fernandes da Silva

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General Manager: A. Fernandes da Silva Consulting Lda

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